Memórias pessoais.
Colégio Estadual Osvaldo Aranha . É algo muito emocionante entrar nesse
lugar onde passei vários anos da minha vida. Conversar com professorxs e
alunxs. Poder olhar para alguns pontos tão familiares desse prédio público onde
vi morte e música e aprendi rudimentos da cultura ocidental na escrita-leitura
e nas visões de mundo.
Regime de representação imagética da negação. EE Redicino de Oliveira Lara. Mesmo tendo sido Promovido a escola de SP comunicou ao meus pais que me recolocaria na mesma série que havia estudado no ano anterior em Minas Gerais, onde supostamente o ensino era "mais fraco". Assim acompanharia "melhor" o desempenho dos demais amiguinhos. Minha primeira experiência de punição em forma de premio, para minha proteção.
Como é uma memória afetiva profunda quase não há lugar para revelar
contradições. Tinha muitos amigos, mas quando quis namorar a menina média e
branca, sua mãe reagiu duramente. Não foi "descoberta do frio", mas
ali a barreira abstrata se materializou. Mas isso era nada, se comparado ao
fato de que apenas jovens negros escolhidos a dedo passavam pelo filtro racial
da direção escolar. Ainda assim o negros "melhores" e mais facilmente
assimilados, não por acaso, eram aqueles tidos como bons esportistas.
Acho compreensível, mas imperdoável meus melhores amigos
daquela época, hoje sustentarem que nunca viram racismo por lá. Certamente é
porque provavelmente também nunca nos viram como éramos, negros numa paisagem
de exclusividade branca Se nós vissem 5 ou 6 negros entre quase mil brancos,
sua sensibilidade, senão sua criticidade, teria captado algum erro.
Foi bom constatar que é hoje
um lugar mais democrático e étnicamente mais diverso. Ver meu amigo
Entretanto a vivacidade e interesse dessa juventude ainda me
surpreende, uma vez que são tão diversamente desestimulados a ver na escola um
espaço significativo e a ter o mais profundo desprezo pela atividade professoral
e pela escola como um todo. Por mais de uma hora falei e ouvi sobre as
possiblidades e impedimentos da escola como espaço criativo.
Li poesias nos olhos sedentos por uma vida mais tesuda. Almocei com
professores e ainda pude localizar em alguns discursos recorrentes sobre a
origem social dos alunos, eufemismos carregados de preconceitos sociais e
raciais. Nesse almoço pudemos ainda sorver da presença fundamental da e
pesquisadora master puc-quilombola
A Escola Pública que estudei era elitista e racista pra caramba (uns 5 ou 6
negros em 1500 alunos), em plena ditadura civil militar na zona sul de São
Paulo. Ainda assim o contato com amigos bacanas e grandes professoras como
Alcione Abramo e Airton de História, Betão de Ciências e Angelina de Língua
Portuguesa, me propiciou uma visão efetivamente humanista de mundo, que até
hoje me orienta na caminhada. Nessa quinta estarei lá para uma roda de
conversa. Bem feliz pelo convite. Viva Escola Estadual Osvaldo Aranha. Grupo de
teatro escolar, talvez 1976.
É pouco provável que nossas experiências
frente ao racismo antinegro se coadunem hoje ou no passado. Minha visão do
Osvaldo Aranha hoje tem a ver com que vivi, mas tambem com minha capacidade de
superar as más vivencias e assim assim alimentar uma visão crítica sobre meu
próprio passado, sem romantismo, como também sem desprezo. Entre eu e meus amigos
do Osvaldo, haviam tantas distâncias e
algumas proximidades. Na infância meu mundo erra dividido apenas entre negros e
brancos, ricos e suas combinações. Nos bairros que morei havia brancos pobres,
mas preto sempre foi maioria.
Escola tornou o racismo mais concreto, eu
fora avisado pela minha família, Se comporte assim ou assado, pois as pessoas
(os brancos que mandam) estão de olho em você, tem que ser bem melhor que um
branco para ter destaque ou conseguir as
mesmas coisas, esse era um tipo muito submisso de uma espécie de orientações
raciais. Pensando ainda no racismo,
creio que negros temos que nos livrar da responsabilidade de fazer com que pessoas
não afetadas por essa indiferença percebam o que elas tem em comum, com quem o
é.
Talvez isso, em nível individual, seja o
aspecto mais cruel do racismo antinegro, levar alguém negro ou negra gastar
tempo excessivo tentando convencer quem se beneficia direta ou indiretamente do
racismo da sua importância.
Muitas vezes vi pessoas negras adultas
tentando em vão chamar atenção dos seus superiores
racistas para suas altas capacidade técnicas. Ora a competência ou falta dela
em situação de opressão racial nem entra na pauta.
Parte 2
Pensando o racismo como estrtuturante e como fonte das relações de poder no Brasil.
Sobre meu eu hoje.
Sou um professor e intelectual
periférico e público. Graduado, mestre e doutor em História social pela PUC-
SP. Ingressei no serviço público como inspetor de alunos no sistema de ensino
estadual em 1985, atuando numa escola pública no bairro do Grajaú, onde morava
nessa época. Sou mineiro de Passos, de uma família de lavradores, migramos para
periferia de SP em 1971 e retornamos para MG em 1978. Portanto vivi a infância
e adolescência entre uma cidade canavieira-cafeicultora do sul de minas e a
preferia de SP. Estudei em escolas públicas nessas duas realidades
contrastantes e complementares durante a ditatura civil militar. 10 irmãos ao
todo, 6 homens e 4 mulheres, dos quais 6 vivos, entre o Amapá e Paraná. Minha mãe era lavadeira e doméstica, viveu
penosamente também empregada de uma empresa de faxina terceirizada, que em
plenos anos 1970 prestava serviços para CEF de Moema. Ela tinha dois turnos, na
agência bancária de dia e outro na casa dos brancos gerentes fazendo faxina no
período da noite. Moro em Itapecerica da Serra desde 1993. Mudamos para cá pois
na época não tínhamos onde morar, estávamos em uma situação econômica muito
precária e família de minha esposa, que até então era bem racista, nos
emprestou uma propriedade deles, que estava desocupada. Desde então tivemos
mais três filhos aqui. Nos adaptamos bem a cidade, um misto de roça e
periferia, tem uma cultura provinciana, misturada com os problemas típicos dos
bairros periféricos. Trabalhei em várias escolas de ensino fundamental e médio
da região. Fiz muitas relações na cidade com pessoas muito interessantes,
ativistas, artistas, educadorxs, intelectuais e também com pessoas comuns.
E sobre identidade e território?
Podemos falar em termos de eu, nós e
eles. Podemos pensar sobre relações humanas e relações de poder. Nesse sentido
entender que lugar ocupamos nós descendentes de africanos nesse arranjo
territorial chamado Brasil, como o espaço humanizado remotamente pelos povos
originários, depois invadido pelos portugueses, depois herdado pelos
descendentes dos colonizadores, que garantiram para si a exclusividade absoluta
dos bens materiais e ferramentas para processar o domínio dos bens simbólicos.
Esses mesmos definiram as fronteiras e construíram a hegemonia política que
embora tenha sofrido abalos importantes ao longos dos séculos, mantem sua
espinha dorsal desde a colônia. Pensando como Stuart Hall, a nação é um
dispositivo discursivo sobre unidade que sob uso de ferramentas próprias da
modernidade, mantem um determinada sociedade não sob mira das armas, mas do temor da condição
apátrida. A nossa condição contraditória e estar alinhado num território para
qual seremos sempre estrangeiros de porta adentro. Ou o seremos enquanto essa
ordem social, econômica, política e racial permanecer, ou enquanto não formos
capazes de reagir a altura dessa opressão secular. Nesse sentido podemos
habitar um território em estado alienado de vinculação ou sem relação de
pertencimento é os caso dos descendentes africanos e os dos remanescentes dos
povos originários autosituados.
Parte 3. Pocessos sociais do racismo antinegro em São Paulo.
Qual é a história da educação em São Paulo, no que toca aos
papeis raciais e aos estereótipos negativos atribuídos aos negros e negras no
processo de ensino/aprendizagem e escolarização?
Então senta que lá vem história: Um amigo recebeu parte da
biblioteca do espolio de um médico/professor falecido, chamado Sergio Raymundo
Hornstein. Além de literatura francesa e livros de Lenin e Marx em diversas
línguas, havia também algumas fotografias, cadernos com anotações e antigos
manuais escolares, a saber: 1-Pontos de Geografia e História do Brasil 1º Ano,
Externato Teixeira Branco de São Paulo,
sem data, contendo 32 páginas. 2- Selecta escolar de Máximo de Moura Santos 19,
publicada pela Livraria Francisco Alves, 11ªEdição, datada de 1957, com 109
paginas. 3- A cartilha de Vicente Peixoto
denominado Coração Infantil, publicado da Edições Melhoramentos, 44ª
edição, datada de 1957. 4- Livro de
Leitura Manuscripta-Licões Colligidas, por B.P.R.; Editora Francisco Alves,
“Aprovado e adotado pelo Governo para Escolas Públicas do Estado”, 128 páginas,
Sem data. Todos encapados com papel jornal grosso, tom amarelado pelo tempo, tal como os recebi.
Chamou mais minha a atenção a cartilha Coração Infantil, pois toda
ilustração existente recai sobre figuras humanas de traço europeu, há imagens
adultos e crianças nas mais variadas situações, sempre relacionadas com tema de
cada conteúdo. O mesmo acontece com a Selecta Escolar, exceto por apenas uma
única imagem de um garoto negro na página 31. A imagem vem acompanhada de um
titulo: Que moleque (Cibele Amorim). Traz também os singelos e “belos”
versinhos:
“Que
é isso, Dito, de argola!...
De
mãos no bolso, emproado!
Voce
não vai hoje à escola?
Oh!
Que moleque danado!
Pensa
decerto que é gente,
Parece
que até cresceu...
O
seu cabelo viu pente!
Mas
que foi que aconteceu?
Tire
essa argola da orelha,
Veja
no espelho sua imagem,
Como
você se assemelha,
A
um negro e feio selvagem!
Até
fiquei espantada,
De
ver você desse jeito,
Assim
de cara mudada,
Um
bobo alegre perfeito.”
Será exagerado fazer inferências sobre práticas educativas e o
sistema de ensino aprendizagem em São
Paulo nos anos 1950, com base apenas nesse material pedagógico?
Nos anos finas da década de 1950, qualquer criança que
ingressasse nas séries iniciais teria obrigatoriamente que estudar com estes
manuais escolares? A cartilha foi adotada pela rede pública de ensino do
Município de São Paulo, até por volta de 1970. Qual terá sido o impacto desse
texto e gravura sobre o imaginário, comportamentos e valores das crianças paulistanas, escolarizadas nessa
época?
No Brasil até que
ponto a escola tem sido instituição pública de responsabilidade social? Essa
responsabilidade é ao mesmo tempo tão grande e tão mal compreendida. Os
educadores (as) escolares, culturais e sociais tão mal prestigiados pela
sociedade, são ao mesmo os protagonistas dessa cultura específica, múltipla e
complexa que identificamos simplesmente como Educação. Que cultura escolar tem
sido elaborada e reelaborada para formação
das nossas crianças? Quais seus pontos nodais? Seus conteúdos e
recorrências?
O desafio dos
educadores e educadoras para incorporar a África e o Brasil Negro e Indígena
aos seus interesses e habilidades pedagógicas, realmente não é fácil. Porque
não se trata de injetar novos conteúdos nas velhas práticas, novos temas as velhas
grades e preceitos curriculares. As leis citadas contêm o ensejo de uma nova
cultura escolar, na qual seus agentes e protagonistas estejam disposto a fazer
uma reflexão e revisão profundas do sobre caráter elitista e racista e,
principalmente do viés eurocêntrico das instituições escolares e socais
educativas, públicas e privadas no Brasil.
Essa tarefa tem
dimensão política e filosófica, a primeira diz respeito às relações de poder e
segunda e a segunda ao caráter profundo e reflexivo do ser. Ser humano.
Educação para a diversidade necessita da combinação dessas duas dimensões.
No Brasil ainda não
parece ser óbvio que o lugar da vida social em que o racismo é mais contundente
e facilmente observável é na divisão sócio-racial do trabalho e no acesso a
escolarização superior. Contudo até que nos anos finais da década 1970, viesse
a tona do trabalho pioneiro de Carlos Hasenbalg (1979), esse tema era
relativamente tabu para o pensamento acadêmico brasileiro. Trabalho, desigualdade e racismo ainda formam
um tripé cujos avanços ainda são pequenos decorridos 40 anos da constatação
sociológica de que o racismo incide vergonhosamente sobre a ocupação e renda da
população afro-brasileira.
Mas o que foi que mudou nos
últimos anos? Atualmente muitos jovens negros têm feito questão de destacar sua
origem, embora para alguns isso pareça uma terrível afronta. Fazem isso, usando
camisetas com estampas de frases bem humoradas ou com retratos de ídolos
negros, vestem roupas e adereços com motivos africanos, ostentam penteados com
inúmeras formas de trançados que se remetem as sociedades tradicionais
africanas. Os jovens mais organizados socialmente ou que pertencem aos
movimentos sociais, entre eles o movimento Hip –Hop, elaboram grupos de
estudos, gravam discos com canções de conteúdo educativo, criam e distribuem
revistas, livros e materiais de divulgação. Seus grafites, na maioria dos
casos, também expressam uma visão positiva
e bastante complexa das suas origens africanas.
Esses prenúncios de
mudança são revelados no dia a dia, quando se percebe a crescente atitude dos
descendentes de africanos, quando conseguem identificar positivamente traços de
africanidade em sim mesmo, independente do tom de sua pele. Esta mudança é
parte de uma dinâmica social e cultural ainda mal compreendida por aqueles
poucos que querem resguardar para si o
direito a justiça, a vida, a liberdade ou o acesso ao conhecimento e a alegria.
A riqueza de
experiências sociais e culturais das comunidades negras desenvolvidas ao longo
do século XX tem sido muito importante, para o alargamento da democracia
brasileira. Embora alguns setores conservadores tenham reagido, às vezes de
forma intolerante e violenta, sobretudo no meio acadêmico, a ampliação
crescente das políticas afirmativas, têm sido obtidas como resposta de alguns
segmentos da iniciativa privada e dos órgãos públicos, no âmbito de alguns
governos municipais e estaduais e sobretudo, ao nível federal.
Há uma mudança
substancial nesses novos comportamentos políticos, uma vez que já que não se
pode negligenciar a existência das práticas racistas de cunho interpessoal, mas
acima de tudo da sua existência no nível institucional e sócio-político, ou seja racismo estrutural.
Estas mudanças são antes resultado da crescente consciência social e política
do segmento negro da população brasileira, como também do reconhecimento da
legitimidade daquilo que se convencionou chamar simplesmente “Movimento Negro”.
Movimentos negros, trata-se de uma multiplicidades de grupos organizados que
congregam indivíduos do sexo masculino ou feminino, que remetem seus traços
étnico-culturais a uma grande coletividade, que tem em comum ancestrais
originários do grande espaço territorial que já foi chamado Aetiópia Inferior, Guiné,
Cuche, Núbia e finalmente África.
Racismo também se
apreende na escola. É possível que antirracismo também se possa apreender. Para
termos uma verdadeira consciência das africanidades brasileiras, normalmente
negadas por preconceito, racismo ou desconhecimento, temos que arregaçar a
mangas e estudar, pesquisar, conhecer, apreender, sistematizar e escolarizar
conteúdos, tal como fazemos cotidianamente com outros temas.
Educadores e
Educadoras verdadeiramente humanistas acatam tais preconceitos e
desconhecimentos como desafios. Com sensibilidade e delicadeza que os temas
exigem, adotam uma nova postura pedagógica de curiosidade, pesquisando,
trocando informações, experimentando abordagens novas para tratar a História e
Culturas da África e do Brasil Negro e Indígena.
Parte 4-
Texto escrito em 2015. Relatório de atividades formativa de professores da Rede Muncipal de Educação de São Paulo.
Vamos pensar que o negro não
existe. Ou melhor, não há um homem negros, capaz de traduzir em termos de
cultura, valores e subjetividade de todos os homens e mulheres negras. Admitamos que a raça seja
uma falácia do ponto de vista biológico, uma vez que não existe um grupo humano, cujos traços
genéticos tenham sido preservados desde tempos imemoriais. Se a raça não
existe, o que é então ao racismo? Aqui racismo antinegro é um conjunto de
práticas, representações e discursos e discriminações relacionadas aos
descendentes de africanos, tidos e entendidos como uma massa humana homogênea,
ou raça específica. Tais práticas, representações, imaginários e discursos
articulados, em última instância visam manter e legitimar relações de poder
históricas, construídas nos últimos 5 séculos, durante o processo de expansão
do ocidente.
Em que medida a instituição
escolar reproduz ou amplia as formas de discriminação praticadas no âmbito
social mais amplo? De outra forma como um programa institucional de combate ao
racismo pode impactar práticas sociais seculares e instaurar uma nova filosofia
ou cultura escolar, que seja multicultural e antirracista? Essa investigação fundamenta-se no acumulo
configurado na bibliografia crítica sobre Relações Raciais no Brasil e nas
experiências sócio-politicas e culturais dos movimentos negros.
O racismo antinegro tem
dimensão mundial, porque também o têm, o tráfico negreiro e escravidão racial,
que estão no seu nascedouro e em parte desdobram e justificam sua evolução e
difusão. Podemos dizer, que ainda está e marcha a crença na superioridade do
ocidente, na cosmovisão concebida como cristianismo, ainda que, tanto a
europeidade como sistema simbólico de unidade e a filosofia religiosa da
cristandade, seja o tempo todo atravessado por cismas e reinterpretações
teológica.
Os racismos antinegro e
antindígena que nasceram do processo
colonial, foram elaborados e reelaborados de forma que naturalizaram a posição
social dos eurodescendentes. Primeiramente se beneficiaram dessa posição
privilegiada as gerações que encabeçaram as transações e transições das
colônias européias nas Américas, a condição de estados independentes. Mesmo
quando estas mesmas elites admitiram sua condição mestiça, e isso não foi
incomum, ainda esta configuração identitária mediada, evitava e manipulava a
identificação direta com africanos e povos americanos originários.
A persistência de tais
desigualdades ora é atribuída a uma “herança da escravidão”, outra ao arcaísmo
dos setores mais pobres que rejeitam ou resistem a entrada na modernidade.
Certa interpretação sociológica constantemente reiterada, ainda insiste em apontar a incapacidade dos descendentes de
africanos em se adaptarem ao trabalho livre. Essa interpretação nega que, os
trabalhadores negro-mestiços livres do final do século, tenham sido
efetivamente dos formadores da “classe operária” no Brasil e atribui aos
estrangeiros introduzidos na política imperial e republicana de branqueamento,
todas a loas de modernidade produtiva.
Tornou-se uma obviedade falar, pensar,
discutir e estudar sobre os “preconceito de cor” e marca, mas ainda hoje o
termo racismo anti-negro e anti-indígena ainda causa pavor em alguns espaços
acadêmicos, no meio jornalístico e é quase que completamente silenciado no meio
artístico e cultural onde predomina uma visão freyriana de sociedade. Qual
seja: Brasil país pacífico, social e culturalmente integrado, nascido das “três
raças tristes”.
Este aspecto impronunciável
de relações sócio-político-raciais tem seu fundamento no que podemos denominar
Pacto Racial Brasileiro. O pacto racial é um contrato estabelecido entre as
partes, entendidas como raças, que compõem a sociedade brasileira e tem sido
refeito desde final do século XIX. Tal contrato é um acordo constituído no
plano simbólico, mas com efeitos práticos e concretos nos âmbitos econômicos,
educacionais, religiosos, jurídicos e culturais.
Esse contrato estabelece uma
hierarquia que cobre todas as coletividades sociais. Também é ele que padroniza
pequenos privilégios e dutos de mobilidade social por meio de atividades
econômicas (licitas e ilícitas). Também e por meio dele que se acessa ou não
dutos políticos, tecnológicos, educacionais e culturais. Mas de maneira geral
tais canais oficiais de deslocamento, não trazem perigo de ruptura da ordem
sociorracial e se transformam em efetivas formas de controle.
Já vimos ao longo da História
recente das sociedades ocidentais que tratados, pactos, contratos são elementos
fundamentais no funcionamento das nações e países. Podem ser percebidos como
Constituições e cartas magnas, mas, também podem ser pronunciadas como regras
advindas da tradição, nesse caso mais implícitas e fundamentadas nas práticas
cotidianas e menos expressas em textos e referenciais institucionais. Vimos
também que para manutenção interna de uma sociedade os pactos entre os diferentes
setores que a compõem podem ser estabelecidos como base na força e mantidos
pela ideologia oficial de dominação e mando.
O pacto racial brasileiro
pressupõe a aceitação pacifica por parte dos negro-mestiços e indígenas de um
estatuto diferenciado de cidadania. Este
estatuto este relacionado as condições “naturalmente inferiores”de
escolarização, trabalho/salário/renda, acesso a saúde, a moradia, transporte
público, credito, ocupação do espaço urbano, securidade social, lazer, etc.
Embora haja mobilidade social
em termos gerais, negro-mestiços e indígenas, geração após geração são
socialmente educados pela ordem vigente, com mensagens de coerção e medo.
Objetivando a acomodação e conformismo.
Violência real e simbólica são também mobilizadas para manutenção da hierarquia
racial. Vêm em forma de ameaça velada de usos das forças oficiais e
extra-oficiais de segurança. A segurança privada desde o século XIX, tem sido
utilizada em situações de eminente conflito por terra, trabalho, atividade
sindical ou política.
Os grupos paramilitares que
antes serviam aos senhores de terras sofreram mutação e têm atuado tanto no
espaço rural, quanto no urbano a despeito das normas legais vigentes. Mas, o
legado de violência da segurança estatal ainda não foi devidamente mensurado
pelos estudiosos. Antes mesmo da independência a elite brasileira da época
havia criado sua própria versão sobre a “luta de raças” em nome daquilo que
Michel Foucault define como e um “patrimônio biológico”. Mais tarde redefinido
como patrimônio civilizatório ocidental.
Organizações civis e
militares e jurídicas, hoje altamente complexas funcionam em todos os espaços
socais em nome do domínio racial, sem pronunciar este fato. As forças de
segurança, ao mesmo tempo que incorporam pessoas oriundas dos setores sociais
racializados pela desigualdade, imolam e descartam estes mesmos indivíduos, em
nome da paz social.
Os pactos realizados no
processo de modernização brasileira tem sido coordenados quase sempre na
manutenção eternizada de hegemonia das elites brancas. Elites mudam, modulam, se alternam na gestão
do poder político, cultural e econômico, mas não deixam de reafirmar seu poder
incontestável de elite racial branca. As Instituições Escolares e culturais têm
sido de fundamentais no apoio a naturalização das desigualdades e no uso de
critérios de seletividade, operados simultaneamente pelos organismos estatais e
privadas.
Logo, o contrato racial
brasileiro também tem sido mantido na operação simultânea das convenções
socialmente elaboradas nos últimos 140 anos, ele define a manutenção das ordens
política, econômica, social e cultural. Nesse caso, podemos sustentar que pacto
racial brasileiro também tem um detalhamento no tange as relações culturais.
Essas convenções e hierarquia
pelas quais zelam tem sido contestadas pelos ativistas negromestiços que desde
a segunda metade do século XIX. Primeiramente Oe embate era contra a cultura
escravista de maneira geral, sobre a qual abolicionistas negros desenvolveram
interpretações e forjaram percepções absolutamente desconcertantes e
inovadoras. Escritos de abolicionistas como André Rebouças, Souza Carneiro e
Manuel Querino, que se somam aos de Luis Gama. Em todos há questionamentos da
escravidão racial e das teorias de inferioridade e superioridade das raças, que
tanto seduzia os intelectuais brancos do mesmo período. Seria mesmo possível
contrapor os escritos jornalísticos e memórias de cada um deles as suas
antíteses nomeadamente racistas como Nina Rodrigues, Silvio Romero e Oliveira
Viana, por exemplo.
Desde o século XIX pesquisadores negros e
não negros têm se ocupado em estudar a população negra. Desde Nina Rodrigues e
Manoel Querino nos finais do século XIX até os atuais Jorge de Carvalho e
Flavio dos Santos Gomes, renomados cientistas sociais brasileiros, de origem
européia e especificamente os norte americanos, estão em busca do eldorado da
democracia racial.
Alguns
transformaram os negros em objeto de estudos e suas influências ainda
são a fortíssimas no imaginário social como também nas pesquisas
contemporâneas. Nomes de brasilianistas como Tomas Skidmore e Roger Bastide
ainda ecoam fortemente em estudos sobre religiosidade, política e cultura.
De maneira geral os ativistas anti-
racistas, intelectuais e pesquisadores negros tem atribuído pouca ou nenhuma
atenção aos estudos sobre a parcela branca da população brasileira. Não por
razões instrumentais, mas também por isso é importante compreender os
parâmetros, dinâmicas, mecanismo da reprodução e perpetuação da hegemonia dos
brancos brasileiros sobre negros, mestiços e indígenas.
Por detrás de uma historia
triunfalista da imigração européia repousam tensões e hierarquias entre
brancos, degradações e discriminação entre estes e trabalhadores brancos e
negros, xenofobia, como também intergrações étnicas, intercâmbios e
experiências de intercâmbios interraciais a serem conhecidas e enfatizadas. Podemos
mesmo tratar de uma tradição afrobrasileira de diferentes tentativas solapar a
hegemonia branco no âmbito da cultura letrada e artística. A essa tradição de
um ativismo político, artístico e cultural onde predominam descendentes de
africanos, que nos referimos como Movimentos Negros.
Até
aqui, suscitar debates com educadores e
educadoras, gestores e gestoras, pais e mães de alunos e construir uma patamar
de audição das experiências e práticas educativas inovadoras das unidades educacionais da rede municipal
de educação. Em termos provisórios, se pode pensar que, conquanto se possa
observar resistências ocasionais as temáticas negras por parte de educadxres individualmente, não se pode dizer que as
unidade se recusem organicamente a assimilar tal debate.
São Paulo, 30
de abril de 2015.
Salloma: história de duas crianças assistindo tv, a criança negra não se vê em nenhuma programação, com exceção dos programas policiais; no trajeto para escola, a criança branca se vê nos outdoors e nas propagandas, a criança negra não entende pq não se vê, ela apenas sente e assimila, no muro da escola só há desenho com referências as histórias de tradição europeia, a professora traz para a sua aula as mesmas de imagens e textos de adpatação de manuauis e contos orais europeus que fomos moldados.O que vem da “europa” é o bom, belo, perfeito. A professora influenciada também, será negligente, parcial e voluntariosa com aqueles que não representam o ideal de beleza. Como produzir uma tomada de consciência e reflexão. Potência, resistência e capacidade de superação por não ser visto. A escola pode ter ações que promovam efeitos duradouros na alma e na subjetividade de todas as crianças não só daquelas consideradas socialmente ideais.