FONTE: https://www.sescsp.org.br/online/artigo/11417_UM+ENCONTRO+QUE+ECOA+E+TRANSCENDE
A cor vermelha do sangue azul do teatro Brasileiro. Ou Brecht e Piaf visitando Paulo Eiró.
A cor vermelha do sangue azul do teatro Brasileiro. Ou Brecht e Piaf visitando Paulo Eiró.
Edith Piaf, nascida Edith Giovana Gassion (
1915-1963), foi a mais famosa e influente da canção francesa, conhecida em todo
mundo civilizado, mesmo pelos que não falam francês.
Eugen Berthold Friederich Brecht (1898-1956) Nome artístico,
foi um dos melhores poetas da língua alemã. E também seu dramaturgo e teórico
de teatro mais importante. E o mais influente encenador do século XX.
Livreto
SESC
A vida em vermelho: Brecht e
Piaf, com Leticia Sabatella e Fernando Alves Pinto
Texto de Aimar Labaki,
Direção de Bruno Perillo.
Direção Musical de Lincoln
Antonio
Músicos: Demian Pinto- Piano,
Zeli Silva –Contrabaixo, Giba Favery- Bateria e Percussão.
Eu e outros professores e
professoras periféricas fomos ao SESC Santo Amaro assistir entusiasmados a peça
mais recente de Aimar Labaki. A vida em vermelho: Brechet & Paif. Um
encontro fictício entre a cantora francesa Edth Piaf e o dramaturgo e encenador
germânico Berthold Brecht.
O que vai refletido aqui, está baseado no texto do caderno de apresentação do espetáculo e uma recepção de um espectador ativo. Muitas das terminologias utilizadas constam nesses materiais. Meu objetivo continua sendo esgarçar as telas dos cânones artístico-culturais das elites brancocêntricas para fazer emergir novas imagens e sons, capazes de ultrapassar o véu que nos separa e nos torna estranhos a nós mesmos. Segundo Caetano, já parafraseando um num sei quem: “Só é possível filosofar em alemão”. E talvez escrever canções só em língua francesa.
O que vai refletido aqui, está baseado no texto do caderno de apresentação do espetáculo e uma recepção de um espectador ativo. Muitas das terminologias utilizadas constam nesses materiais. Meu objetivo continua sendo esgarçar as telas dos cânones artístico-culturais das elites brancocêntricas para fazer emergir novas imagens e sons, capazes de ultrapassar o véu que nos separa e nos torna estranhos a nós mesmos. Segundo Caetano, já parafraseando um num sei quem: “Só é possível filosofar em alemão”. E talvez escrever canções só em língua francesa.
Uma cultura teatral de elite
agoniza hoje no Brasil, estamos assistindo então as buscas por refugio dos
detentores de uma cultura artística vinda da Europa no século XIX e que se
prolongou com vigor aqui até a década de 1990. Agora seus últimos suspiros. Sua
respiração é feita por aparelhos. Um desses aparelhos é o SESC São Paulo. Um dos
seus médicos mais primorosos e resilientes é Danilo dos Santos Miranda.
O tempo idealizado do refugio é a
Europa do entre e pós guerras.
Brecht (Fernando Alves Pinto)
cantava suas próprias de parcerias com Kurt Weil, aqui traduzidas por Cacá Rosset.
Piaf (Leticia Sabatella) também canta
suas e de outros. Tudo tem cunho didático,
facilitação de Brecht e Piaf para gente inculta, tal como somos vistos, desde
que a tal elite fez contato visual e cultural conosco há alguns anos.
Um trio de músicos brancos, dois
solistas iguais. Ao que parece apenas um dos camareiros era negro.
O texto de tão leve e
pretensamente didático, chega a ser leviano. Reduz o contexto altamente
complexo da guerra fria e transito épico de Brecht de um extremo ao outro
daquele mundo cindido. Também esquece o fato da industrialização da cultura
musical e teatral naquele tempos e quase
arrasa as personas de Piaf e Brecht.
FONTE: https://www.sescsp.org.br/online/artigo/11417_UM+ENCONTRO+QUE+ECOA+E+TRANSCENDE
FONTE: https://www.sescsp.org.br/online/artigo/11417_UM+ENCONTRO+QUE+ECOA+E+TRANSCENDE
As canções intercalam os textos e
os arranjos são eficientes, não sobra nem falta. Algo no teor recorrente e mais
geral do texto nos dá a entendem que Brecht era um “mulherengo” típico,
enquanto Piaf parece ter preferência especial pelo sofrimento. A vida e o acaso
são bem mais complexos que isso. Muito mais que tensão entre razão ( Brecht) e
emoção (Piaf).
No caderno de apresentação Labaki
sustenta que se recusa ao dualismo.
Seria a síntese? Aparentemente Breceht e Piaf ocupam lugar antitético na
construção da cultura europeia do século XX. (Alguns hão de reafirmar com razão
e alguma raiva: Na cultura universal, seu silvícola) Eu admito que sou um
verdadeiro bárbaro nigro diante de um suposto prédio romano blanc expandido.
A Chansson derramada e
sentimental de Piaf em tudo dialoga com certas
tradições musicais
afro-americanas e todos os elementos do Jazz atravessam e atravessam as
concepções de Kurt Weill.
Labaki diz:“ Já vivi o bastante
para saber que a vida não é preto e branco- a vida é cinza.
Ainda que estes tempos de
radicalismos verbais e perplexidade parasilsante nos levem acreditar em
dualismos pétreos”
Para Labaki o vermelho evocado em
seus textos é como uma cor signo que liga Piaf à Brecht, “um vermelho
imprescindível “, não aquele do “sangue nos olhos ou da guerra ininterrupta,
mas o vermelho do sangue nas veias“.
Piaf é resumida em paixão e
emoção, mas sua opção pelo afeto é racional ao passo em Brecht há espirito de sacrifico
em prol da revolução nos palcos ou nas
ruas.
Algumas poucas piadas sobre a
cultura digital, ao culto às celebridades e mais efetivamente aquilo que os
dramaturgos contemporâneos podem oferecer, uma diversão boa e barata, em uma
unidade avançada do SESC. Nenhuma dose de contradição ou calor humano prometida no
caderno. Falta febre e sangue, falta vemelho-quente. Sobra o sangue azul-verde
da friagem costumeira. E não mais o verde das matas nem dos olhos dos olhos da
“mulata”.
Um suposto conflito entre duas
psiques e experiências sócio culturais diversas não aflora, caminham em
paralelo , mas não se tocam, não entercruzam. Mas parece possível supor que que
sejam reconstruídos num textos
para incultos como nós, dois símbolos da cultura ocidental que fascinam as
elites culturais brasileiras.
O germanismo e o francesismo
podem ser entendidos como duas formas complementares de adesão cultural de
diferentes tempos e setores das elites brasileiras entre os séculos XIX e XX. Na
segunda década do século XXI, quando os silvícolas estão a porta e os
pseudo-colonos foram definitivamente abandonados pelas suas metrópoles, parece
não restar outra saída senão a idealização das (puras) culturas artísticas
europeias do século XX. Mas que sejam leves e sem compromisso com as questões
da sociedade brasileira contemporânea.
Mesmo na periferia atual de
sampa, quando uma artista quer comprovar sua ascensão estética decora ou
memoriza ao menos uma canção de Edith Piaf. Na primeira oportunidade trata
de exibir tal erudição nos saraus. Sim, o contraste está feito, se pode ser
periférica, mas não inculta como a massa esquálida de restos silvícolas.
Leticia Sabatella se ergueu um
tanto além das figuras típicas da elite cultural brasileira. Fez crítica ao
patrão, se irmanou de mulheres negras, andou em acampamentos. Recusou o lugar
destinado as celebridades televisivas convencionais. Parabéns.
Os espetáculos deles, desde os
anos 1960, devem muito a televisão, assim como o teatro deve a telenovela.
Tarcísio Meira nosso herói bonitão dos anos 1960-1960 advindo do teatro para a TV
e daí novamente para o teatro, foi quem disse isso em uma recente entrevista de
radio: “A telenovela é, no Brasil, o
verdadeiro teatro dos pobres”.
De fato o teatro e a dança têm
sido guardados por eles como se fossem reservas especiais de vinhos importados
das altas Europas. O humanismo, embora contraditório funcionava como uma
espécie de freio das perversidades modernas. Agora que os valores do ocidente
foram definitivamente para o vinagre, as elites brancas daqui se vêem obrigada
a repartir algo que restou da ideia de liberdade e civilidade, mas não nos
franquiam as mesas e nem nos oferecem as melhores safras. Creio que pensam em
facilitar nossa digestão, afinal nosso paladar não poderia apreciar gostos de
tal requinte.
A alta classe média paulistana,
inclusive aquela ligada a produção
artístico-cultural privada ou estatal, via de regra se nega, a se ver como
elite. Eu entendo essa recusa. Nos discurso oficiais ainda paira a ideia geral esse
país de verdes matas, cachoeira e cascatas nunca houve terremoto e nem
antagonismo de classe. O racismo só pode ser entendido como autoflagelo de
negro e índios. Todos são mestiços de alguma forma e branco mesmo nunca houve.
Os brancos, em certas ocasiões também se recusam a sê-lo. Todas as pesquisas recentes que indicam sistemática
concentração de poder, prestígio e renda entre os descendentes de europeus são,
na verdade, calunias ou sandices de pesquisadores da FGV, SEAD, IPEA, IBGE.
Ao início do século XX, a cultura
musical erudita havia passado uma régua sobre todas as formas de expressivas de
musicalidades da Europa ocidental. A forma canção na França somente se exprimia
de forma agonizante como cantiga de rua e de prostibulo, mas ainda assim já
parecia depender de conteúdos vindos da musica negra estadunidense. A pardal,
Piaf então é símbolo de uma França que agoniza sob a pressão germânica. Labak
se lembrou bem disso.
Ao fim Piaf é resumida em paixão e
emoção, mas sua opção pelo afeto é racional ao passo em Brecht há espirito de sacrifico
em prol da revolução nos palcos ou nas
ruas.
Algumas poucas piadas sobre a
cultura digital, ao culto as celebridades e mais efetivamente aquilo que os
dramaturgos contemporâneos podem oferecer, uma diversão boa e barata, em uma
unidade avançada do SESC. Nenhuma dose de contradição ou emoção prometida no
caderno. Falta febre, calor e sangue vemelho-quente. Sobra o sangue azul-verde
da friagem costumeira. E não mais o verde das matas nem dos olhos dos olhos da
“mulata”.
Um suposto conflito entre duas
psiques e experiências sócio culturais diversas não aflora, caminham em
paralelo , mas não se toca, não entercruzam. Mas parece possível supor que que
se encontram reconstruídos num textos
para incultos como nós, dois símbolos da cultura ocidental que fascinam as
elites culturais brasileiras.
O germanismo e o francesismo
podem ser entendidos como duas formas complementares de adesão cultural de
diferentes tempos e setores das elites brasileiras entre os séculos XIX e XX. Na
segunda década do século XXI, quando os silvícolas estão a porta e os
pseudo-colonos foram definitivamente abandonados pelas suas metrópoles, parece
não restar outra saída senão a idealização das (puras) culturas artísticas
europeias do século XX. Mas que sejam leves e sem compromisso com as questões
da sociedade brasileira contemporânea.
Mesmo na periferia atual de
sampa, quando uma artista quer comprovar sua ascensão estética decora ou
memoriza ao menos uma canção de Edith Piaf. Na primeira oportunidade trata
exibir tal erudição nos saraus. Sim, o contraste está feito, se pode ser
periférica, mas não inculta como a massa esquálida de restos silvícolas.
Leticia Sabatella se ergueu um
tanto além das figuras típicas da elite cultural brasileira. Fez critica ao
patrão, se irmanou de mulheres negras, andou em acampamentos. Recusou o lugar
destinado as celebridades televisivas convencionais. Parabéns.
Os espetáculos deles, desde os
anos 1960, devem muito a televisão, assim como o teatro deve a telenovela.
Tarcísio Meira nosso herói bonitão dos anos 1960-1960 advindo do teatro para a TV
e daí novamente para o teatro, foi quem disse isso em uma recente entrevista de
radio: “A telenovela é, no Brasil, o
verdadeiro teatro dos pobres”.
De fato o teatro e a dança têm
sido guardados por eles como se fossem reservas especiais de vinhos importados
das altas Europas. O humanismo, embora contraditório funcionava como uma
espécie de freio das perversidades modernas. Agora que os valores do ocidente
foram definitivamente para o vinagre, as elites brancas daqui se vêem obrigada
a repartir algo que restou da ideia de liberdade e civilidade, mas não nos
franquiam as mesas e nem nos oferecem as melhores safras. Creio que pensam em
facilitar nossa digestão, afinal nosso paladar não poderia apreciar gostos de
tal requinte.
Eu e outros professores e
professoras periféricas fomos ao SESC Santo Amaro assistir entusiasmados a peça
mais recente de Aimar Labaki. A vida em vermelho: Brechet & Paif. Um
encontro fictício entre a cantora francesa Edth Piaf e o dramaturgo e encenador
germânico Berthold Brecht.
A alta classe média paulistana,
inclusive aquela ligada a produção
artístico-cultural privada ou estatal, via de regra se nega, a se ver como
elite. Eu entendo essa recusa. Nos discurso oficiais ainda paira a ideia geral esse
país de verdes matas, cachoeira e cascatas nunca houve terremoto e nem
antagonismo de classe. O racismo só pode ser entendido como autoflagelo de
negro e índios. Todos são mestiços de alguma forma e branco mesmo nunca houve.
Os brancos, em certas ocasiões também se recusam a sê-lo. Todas as pesquisas recentes que indicam sistemática
concentração de poder, prestígio e renda entre os descendentes de europeus são,
na verdade, calunias ou sandices de pesquisadores da FGV, SEAD, IPEA, IBGE.
Ao início do século XX, a cultura
musical erudita havia passado uma régua sobre todas as formas de expressivas de
musicalidades da Europa ocidental. A forma canção na França somente se exprimia
de forma agonizante como cantiga de rua e de prostibulo, mas ainda assim já
parecia depender de conteúdos vindos da musica negra estadunidense. A pardal,
Piaf então é símbolo de uma França que agoniza sob a pressão germânica. Labak
se lembrou bem disso.
A Piaf de Labaki está acocorada sobre aquela recentemente vista no cinema, mas é mais magra e bem menos complexa.
A Piaf de Labaki está acocorada sobre aquela recentemente vista no cinema, mas é mais magra e bem menos complexa.
Paif e Brecht agora são de todo mundo, inclusive daqueles que pertecem ao mundo incivilizado.
A pouco mais de 500 mestros do SESC, fica o Teatro Paulo Eiró, um dos poucos postos avançados da cultura teatral. Paulo Eiró foi um dramaturgo paulista da segunda metáde do século XIX, vivia em Santo Amaro, uma comunidade modesta, numa província pobre. São Paulo de anteontem.
O teatro se refugiou na telenovela durante a ditadura, pelo visto a telenovela está se refugiando no teatro na era do trumpismo e temerismo. Mas a culpa há de ser nossa, os incultos.
O teatro se refugiou na telenovela durante a ditadura, pelo visto a telenovela está se refugiando no teatro na era do trumpismo e temerismo. Mas a culpa há de ser nossa, os incultos.
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